África do Sul 2010: Paradigma de Cruyff

Domingo joga-se a final de um Campeonato do Mundo memorável, pela primeira organização da prova no continente africano, pela componente cultural adjacente a esse facto, pelas surpresas que assistimos, pela queda prematura de potenciais candidatos, como França e Itália, por um Brasil descaracterizado, por uma pouco coerente mas excitante Argentina, por desempenhos dignos de registo das equipas sul-americanas, com destaque claro para o Uruguai, por uma temível Alemanha e por fim por duas equipas fantásticas, capazes do melhor futebol visto nas terras de Mandela.

Às 19.30h, hora portuguesa, disputa-se uma final inédita e que pode servir de exemplo para o Mundo do Futebol, Holanda e Espanha têm neste momento duas equipas fantásticas, com princípios similares mas com estilos diferentes, no entanto ambas evoluíram sob o mesmo paradigma, sob uma visão superior de Cruyff, mais do que uma ideia de jogo, uma cultura dentro do jogo. Por isso mesmo se pudesse escolher como ver a partida, queria vê-la pelos olhos desse mago, pela visão abstracta de um holandês que mudou a face de dois países tão distintos mas que olham e tratam a bola como ela merece.

Realço a importância dessa cultura, da evolução das duas selecções ao longo dos anos, a partir do "futebol-total" desse profeta, Holanda e Espanha progrediram a vários níveis e moldaram a estrutura das suas equipas desde a base, na Holanda temos uma réplica disso mesmo à vários anos, onde mesmo sem grandes vitórias o estilo da laranja mecânica tem-se mantido fiel a si mesmo, já em Espanha os últimos anos têm sido fantásticos a este nível, quase como uma bomba que explodiu na Catalunha e tem revolucionado o futebol espanhol, ultrapassando a fúria espanhola para nascer o "futebol de toque", uma arte que tem no Barcelona a sua obra-prima, e nos seus jogadores os mais incríveis artistas, com Guardiola como discípulo de Cruyff, quase um mecenas duma revolução artística à imagem da que se viu em Florença entre fins do século XIII e meados do século XVII. Felizmente Aragonés e Del Bosque souberam adaptar toda esta evolução à selecção e formar uma das equipas mais sedutoras de sempre. Em todo este processo é fundamental mencionar um ponto, o da formação, o da preparação, o da criação de uma ideia/modelo de jogo subjacente a uma equipa/selecção, é algo que vemos neste dois países e é por isso mesmo que temos estes resultados a grande nível. Urge outros países, incluindo o nosso, perceberem o que está mal e o que precisamos de evoluir, para bem do futebol.

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