27 de Janeiro de 2008

27 de Janeiro de 2008. Na minha opinião, foi este o dia que mudou o passado recente do Futebol Clube do Porto, nomeadamente na sua abordagem em relação ao futuro e à táctica mais desejada. Na refastelada tranquilidade da sua experiência, sentado no banco de suplentes de Alvalade, o F.C.Porto tentou pela primeira vez ultrapassar o seu “Bojador” táctico. Se o 4x3x3 se mostrava eficaz a nível interno, para conquistar a Europa é necessário assimilar os pressupostos do 4x4x2. Falhou. E aqui começou uma nova etapa da aventura portista!

Com catorze pontos à maior, o resultado pouco importava. Enfrentando uma equipa de nível superior, Jesualdo Ferreira colocou quatro elementos no meio-campo, juntando Marek Cech ao triângulo constituído por Paulo Assunção, Raúl Meireles e Lucho González. Os dragões, na primeira parte, não conseguiram travar os leões, mostrando que os princípios ao nível do 4x4x2 ainda estavam desconectados. Só na segunda metade, voltando ao tradicional 4x3x3, é que os dragões estiveram mais próximos da sua real imagem.

A assimilação táctica do 4x4x2 é essencial para quem quiser dar cartas no futebol europeu. É fácil de perceber, até pelo conhecimento dos vencedores recentes da Liga dos Campeões. Assim, o tapete adivinhava-se curto para os dragões na competição milionária, algo que se viria a confirmar. O adversário, teoricamente acessível, foi encarado em 4x3x3 e a eliminatória acabou por ser decidida na lotaria das grandes penalidades. É um facto que o F.C.Porto controlou o Schalke 04 mas será que o dominou? Também é verdade que os dragões são melhores mas qualidade é sinónimo de eficácia? Eu penso simplesmente, na resposta a estas questões, que o F.C.Porto foi eliminado pela sua própria redoma, enredilhado nos seus limites.

Na nova temporada, a abordagem foi ambiciosa mas algo arriscada. Ganhar o campeonato com o F.C.Porto parece ser um hábito, até porque já houve treinadores medianos que o conseguiram. É a força da estrutura, mas Jesualdo Ferreira não quer ser mais um. Quer deixar a sua marca e se a sorte pode sorrir aos audazes também o risco pode ser uma balança de dois destinos. Com jogadores-chave fora do plantel(Assunção e Quaresma) as ideias de Jesualdo Ferreira, a meu ver, passaram pelo reforço do arcaboiço físico da sua equipa e pela construção de uma dinâmica de 4x4x2 suficientemente versátil para obter performances de rendimento interno e externo.


Em serenos sobressaltos...

Chega Sapuranu para garantir solidez no quarteto defensivo, quer na ocupação de espaços quer no auxílio aéreo. Do lado contrário as coisas parecem não correr tão bem, com a falta de rendimento de Benitez a motivar um plano “B”. É Fucile, com maior ou menor sacríficio, quem melhor segura as amarras neste flanco. Para o meio é Fernando, com maior noção de equilíbrio na altura do processo defensivo, quem agarra o lugar, perdendo lentamente a timidez que impedia a equipa de se esticar um pouco. Altos, com poderio físico, Guarin e Tomás Costa oferecem uma dimensão aérea e técnica superior com Bolatti, muito lento para o futebol europeu, a ser “carta fora do baralho”. Mais á frente, Rodriguez oferece velocidade aos flancos ao mesmo tempo que se adapta com mais versatilidade ao ataque pelo meio, conferindo vitalidade ao, na minha perspectiva, grande reforço da época. Do Japão vem um goleador com nome de super-herói com tudo para ser um jogador de elite: tem velocidade, técnica, remate espontâneo, pode jogar pelos flancos e adapta-se perfeitamente ao 4x4x2. O incrível Hulk!

É com estas premissas, e com estas peças de xadrez, que Jesualdo Ferreira vai tentar montar o seu novo tapete. O caminho do risco trouxe, neste primeiro terço da época, algumas vozes de contestação. Foi esta a escolha de Jesualdo, que entendeu os assobios externos e, de uma forma hábil, os transformou em motivação para a sua própria equipa. Três derrotas consecutivas chegaram a colocar em causa o seu lugar. Diz-se que o estado de espírito da cidade está intimamente ligado ao rendimento dos portistas. Uma estrutura forte, coesa, faz com que esta fase de sobressaltos seja apenas...de serenos sobressaltos! Jesualdo recupera folgor no campeonato, elimina o Sporting da Taça de Portugal e qualifica-se na Liga dos Campeões. O dragão segue com chama bem acesa em todas as competições e o novo sistema táctico está finalmente a carburar! A exibição de Istambul assim o prova mas, novamente com muita experiência, o timoneiro dos dragões volta a por água na fervura. Atenção que nem tão bons, nem tão maus. Apenas a realizar o trabalho planeado.


Copa BES

Tenho na cabeça a imagem de Jesualdo Ferreira, impávido e sereno no Estádio da Luz, observando os últimos minutos da partida como se fosse um espectador leixonense. No acumulado dos seus anos de treinador, sabe à partida que os pontos em disputa com os grandes são apenas 12. Importa sim o debruçar atento sobre os restantes 78. Esses sim garantem títulos. Constato isso quando o observo, no Estádio dos Arcos, a incentivar a equipa para a vitória, como que tentando abafar a ansiedade no seu longo sobretudo. Um empate com o Rio Ave não vinha nada a calhar!

É desagradável sofrer quatro golos do Arsenal mas, se pensarmos friamente, e daí? Jesualdo orienta as suas baterias de combate para turcos e ucranianos. Esses sim garantem a qualificação. O Arsenal fica para depois, noutra fase em que a equipa esteja suficientemente madura. Porque os caminhos se fazem caminhando...

Decididamente, Jesualdo Ferreira não é um treinador de Copa BES. Olhando para as competições como um todo, toma as decisões com base no resultado, fazendo uma espécie de calendário em que os jogos com maior probabilidade de vitória sobressaem em detrimento de outros porventura mais difíceis. Uma visão que não reúne consenso, é certo, mas será que os caminhos, antes de serem feitos, não são planeados? O todo como soma de todas as partes e não uma parte como justificação do todo. Penso logo concretizo. Jesualdo polvilha a receita com experiência e o navio segue a bom ritmo!


Assinado
Gil Nunes

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